Discurso proferido pelo Secretário-Geral da Academia Tourense de Cultura, Ciências e Política – ATCCP, Flávio Patrício, por ocasião da votação do projeto de Lei de Incentivo à Cultura, pela Câmara Municipal de Touros/RN, dia 23 de setembro de 2020. Projeto este apresentado pela instituição à Prefeitura Municipal de Touros.
|
(Flávio Patrício ocupando a tribuna da casa do povo tourense) |
Excelentíssimo senhor, José Thiago Santana Neto Farias, presidente desta egrégia casa de leis. Excelentíssimas senhoras vereadoras, excelentíssimos senhores vereadores, a todos e todas aqui presentes e a todos e todas que nos acompanham pelas redes sociais. Quero primeiramente agradecer pelos elogios a pessoa do meu nome, mas falo também que é motivo de muita honra, muita satisfação em poder estar ocupando, na qualidade de cidadão, pela primeira vez, aqui a tribuna.
Vereador Diego França, a nossa tribuna, senhoras e senhores, a tribuna do povo. A tribuna de um povo, senhor presidente, a tribuna do nosso povo. Flávio Patrício está aqui representando não a ele mesmo, mas ao povo através de uma instituição, instituição essa, professora Bel, da sociedade civil organizada. Instituição que tem como presidente o nobre e admirável, Antônio Tenório Sobrinho, filho de Touros, escritor, músico por formação, pesquisador, um verdadeiro guerreiro em defesa da cultura do nosso povo. E em virtude de suas atribuições laborais não se faz presente de corpo, nesse momento histórico para a cultura de Touros, mas de alma sim.
Faço parte dessa associação privada, instituição sem fins econômicos, repito, sem fins econômicos, constituída por pessoas livres, que têm seu objetivo, se confunde com o objetivo deste projeto de lei que hora vossas excelências se debruçam. Defendemos a cultura, professora Bel, defendemos nossa história, nossos valores, nossos costumes, nossas tradições. Qual a importância que damos a nossa cultura, verdadeiramente?
Falo que nossa instituição, frisei que é sem fins econômicos, geralmente é utilizado o termo sem fins lucrativos, mas, vereador Paulinho, toda e qualquer instituição pra justificar o seu sentido de existência, necessariamente tem que buscar o lucro. Não o lucro financeiro, que se materializa na multiplicação financeira ou patrimonial. Falo de um lucro mais nobre, vereadora Tetê. Eu tenho dificuldade de mensurar, de valorar, de quantificar o lucro que tem uma instituição como Unidos para Vencer, de um baixinho que de vez em quando está aqui nessa tribuna, Willian Barbosa da Silva. Eu tenho dificuldade de mensurar o lucro de transformar jovens em cidadãos. Não pelos troféus, não pelas medalhas, mas por ter transformado jovens em cidadãos.
Eu tenho dificuldade de mensurar também qual o valor do sorriso de uma criança ao despertar pela leitura, de buscar sua história, as suas tradições. Apesar de ser contador por formação, eu tenho dificuldade de valorar, de quantificar. Quanto vale isso? Isso é lucro? É o lucro que podemos dizer, o lucro social, o lucro cultural.
Defendemos a memória. Somos um município rico em fatos históricos. Temos história. Inegável. O que nos falta é memória. E um povo sem memória, nobre vereadora Fernandinha, é um povo susceptível a erros contumazes, erros reincidentes. Um povo sem memória é um povo susceptível à enganação, a manipulação e a dominação.
Buscamos com isso uma identidade, vereador Francisco Vieira. Não uma identidade que se materializa num pedaço de papel, se materializa num papel plastificado com uma fotografia, com teus dados pessoais e com um número pra controle de Estado. É algo mais nobre, professora Bel. Nós queremos uma identidade que nos diga quem somos enquanto povo.
...Esse silêncio é proposital. Não é branco. É para que vocês pensem, para que a população pense, reflita. Não falo num pensar simples, não falo num refletir simples. Eu falo naquilo que Pierre Bourdieu fala, um pensar complexo, a reflexão mais profunda. O que nós queremos ser enquanto povo, e nossa cultura reflete aquilo que somos enquanto povo. Eu defendo, nossa instituição defende a cultura, não no stricto sensu da palavra, mas no sentido mais amplo, seja a cultura erudita, seja a cultura popular, seja a cultura das massas. Defendemos a cultura do nosso povo. E eu tenho convicção do apoio desta casa, de forma incondicional. A cada um que eu tive contato aqui, fui muito bem recebido, com atenção e de forma extremamente democrática e republicana.
Essa questão em relação ao projeto de lei propriamente dito, eu posso pontuar algumas coisas aqui que eu julgo mais importantes, tendo em vista que este projeto de lei ele é muito pragmático. Está explícito os objetivos desse projeto de lei, que trata do incentivo fiscal para projetos culturais, esse é o artigo primeiro, “Fica o poder executivo municipal autorizado a instituir no âmbito do município de Touros, incentivo fiscal para projetos culturais, a ser concedido a pessoas físicas ou jurídicas domiciliadas no município de Touros”.
Temos também a figura do certificado de incentivo fiscal, que nada mais é do que um título, um título público, um certificado que será emitido a qualquer proponente, ele sendo pessoa física ou jurídica, que elabore um projeto cultural e que esse projeto seja aprovado pela comissão municipal de avaliação.
De posse desse certificado, esse proponente poderá angariar recursos junto às empresas domiciliadas no município e esses valores doados. Eles serão compensados nos tributos de competência do município, mas especificamente os impostos, e dentre eles O ISS e o IPTU. Essa doação, esse financiamento, está vinculado ao teto máximo de vinte por cento de cada imposto. Por exemplo, se uma empresa tem cem mil reais para recolher aos cofres públicos a título de IPTU ou ISS, ele pode adotar, senhor presidente, um projeto de lei de até vinte mil reais. E quando do recolhimento, ao invés de recolher uma guia de cem mil reais, ele, ele irá recolher uma guia de oitenta mil reais e pedir a compensação daquele título que ele tem em posse, em virtude do financiamento desse projeto. Então vejam bem a praticidade que é você conseguir recursos para executar um projeto cultural.
Vereador Felipe França, eu sinto dificuldade em chegar a uma empresa pra pedir recursos, financiamento, porque as empresas já têm suas despesas obrigatórias, mas a partir da hora que eu chego com o título e, olha, você ao invés de recolher cem por cento ao município, ajude esse projeto social, ajuda a nossa cultura, a nossa arte.
Então, hoje o que nós estamos presenciando aqui é um fato histórico. Talvez a gente não tenha a dimensão das consequências.
Eu costumo ser otimista, como diria Ariano Suassuna, “o otimista é um tolo, o pessimista é um chato, bom mesmo é ser um realista esperançoso”. Sejamos realistas esperançosos.
Existem três tipos de possibilidades de financiamento desses projetos culturais. Tem o proponente, que é aquela pessoa que elabora o projeto, que leva pra comissão avaliar se está dentro dos trâmites legais; existe o doador, pode ser pessoa física ou jurídica domiciliada no município, ele, doador, ele terá a compensação de cem por cento do que ele doar; existe a figura do patrocinador. Neste caso a instituição que está patrocinando tem um retorno institucional, porque necessário se faz a publicidade e a divulgação do nome dessa instituição. O projeto levar o nome daquela empresa, publicidade, a divulgação e tem o retorno de participação nos resultados. Sendo que, no patrocínio ele compensa noventa por cento do valor patrocinado. Se ele patrocinou dez mil, ele vai compensar nove mil reais. E no caso do investimento ele será compensado em oitenta por cento. Então, tem essas possibilidades para que a empresa opte, o que é mais conveniente do ponto de vista institucional pra ele. Tanto institucional, quanto de questões de ordem financeira.
Em relação à questão do impacto deste projeto de lei no orçamento de nosso município. Veja bem, eu gosto muito de analisar o orçamento de nosso município. Analiso o orçamento que vossas excelências aprovam anualmente. Mas o que me atrai mesmo é a execução orçamentária.
Alguém poderia dizer, por que que a instituição está levando pra Câmara um projeto de lei para financiamento de projetos culturais que o próprio município poderia realizar? Poderia constar no orçamento do nosso município dotações orçamentárias destinadas para a cultura. Eu não sei se vossas excelências lembram os valores destinados à cultura do nosso município. Transitado, debatido e aprovado nesta casa, no último ano.
Em relação a essas possibilidades de execução pelo município, o que eu posso dizer a vocês é que, infelizmente a execução orçamentária mostra uma distorção muito grande com relação ao orçamento aprovado e a execução orçamentária.
O preço e a importância que damos a nossa cultura. Nos últimos cinco anos, dois mil e quinze, teve dotação inicial aprovada nesta casa aqui de trinta mil reais, a execução foi zero; dois mil e dezesseis, dezesseis mil reais, aprovada no orçamento, a execução foi zero; dois mil e dezessete, dezesseis mil reais foi a dotação inicial, a dotação foi atualizada para vinte e um mil reais e foi executado dez mil; em dois mil e dezoito tivemos uma dotação inicial de cento e trinta e cinco mil reais, foi atualizado para trinta e um mil e foi executado vinte mil reais; e no último ano, senhoras e senhores, foi aprovado nesta casa uma dotação de trezentos e quarenta e cinco mil reais para a cultura do nosso município. A dotação atualizada foi pra sete mil reais, foi executado dois mil e quinhentos reais. Portanto, todo e qualquer argumento contrário a esse projeto de lei, no que diz respeito a que existe dotação orçamentária, cai por terra. Por isso a importância de vossas excelências aprovarem integralmente esse projeto de lei. Eu não tô aqui pra criticar o executivo. Não tô aqui pra criticar o legislativo. Eu tô trazendo fatos, números, disponíveis nos órgãos oficiais, acessível a qualquer cidadão. Isso é fato, incontestável. Eu trago aqui uma oportunidade, uma alternativa pra que a sociedade possa participar, efetivamente, de projetos culturais, sem depender de aprovação de orçamento ou de execução orçamentária por parte do executivo municipal.
Temos verdadeiros guerreiros que lutam de forma solitária pela cultura do nosso povo. Muitas são as pessoas, mas vou citar, por exemplo, Dione Maria do Nascimento, uma defensora de nossos valores, de nossa tradição, de nossa cultura.
Gente, eu posso falar pra vocês que em relação à questão orçamentária fica muito claro que esse projeto de lei venha atender à demanda dos anseios, dos desejos do nosso povo. Por isso a necessidade da aprovação desse projeto de lei.
Quando se elabora um orçamento público, têm que se cumprir todos os princípios que vossas excelências sabem. Aqueles que sempre fala, o princípio da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, mas um dos princípios que não podem ser negligenciados é o princípio da prudência na elaboração do orçamento, que na prática é você subestimar as receitas, em contrapartida superestimar as despesas, porque em havendo o pior dos cenários está dentro das previsões orçamentárias.
Como esse incentivo fiscal está vinculado às receitas, logo atende ao princípio da prudência: buscar o equilíbrio sobre todas as coisas. Tivemos equilíbrio em elaborar esse projeto de lei. Somos conhecedores do estrangulamento orçamentário do nosso município a muito. E não iríamos, de forma nenhuma, propor algo que viesse a estrangular mais ainda esse orçamento, mas também reivindicamos a valorização da nossa cultura. Isso vem atender essa demanda. Portanto, só pra resumir a questão do orçamento, das dotações orçamentárias iniciais aprovadas nesta casa e a execução, em torno de seis por cento do que foi orçado inicialmente foi efetivamente executado nos últimos cinco anos.
Nós não temos resposta pra tudo, mas como diz Thomas Piketty, “A história nos ensina. Temos muito a aprender com a história”. E esse diagnóstico ele tá fundamentado em dados oficiais. Em uma série histórica. E este incentivo fiscal ele não pode ultrapassar entre cinco e dez por cento dos valores referentes ao ISS e ao IPTU. Isso vai corresponder a, no máximo, 0, 4% do orçamento geral do município. A capacidade de arrecadação para projetos culturais compromete esse percentual, que é muito pouco provável que haja essa arrecadação cem por cento desse valor, porque o IPTU ele é concentrado, é pulverizado mais em pessoas físicas e valores pequenos. E é muito difícil um proponente juntar cem, duzentas, trezentas pessoas pra direcionar aqueles cinco por cento de IPTU pra o seu projeto. Isso fica mais concentrado no ISS, que são valores mais elevados de grandes empresas. São coisas pontuais.
Eu gostaria de falar um pouco agora da questão de valores. Nós temos, nos últimos dez anos, o IPTU do ano dois mil e dez foi de cento e trinta mil reais, a previsão, a execução, na verdade. E hoje nós temos, em dois mil e dezenove, quatrocentos e oito mil reais, uma evolução considerável. E de ISS saiu de dois mil e dez, quatrocentos e sessenta e oito mil para três milhões cento e sessenta mil reais.
Então, mesmo esses valores sendo elevados ele corresponde a um percentual muito pequeno em relação ao orçamento geral.
Senhoras e senhores vereadores, muitas vezes me perguntam se isso vale a pena, o esforço em sair debatendo com os demais colegas, com os vereadores, com o legislativo, o executivo, se vale a pena lutar por isso, e eu digo que eu tenho esperança. Entre São Tomé e Santo Agostinho, vereador Nenê, eu fico com Santo Agostinho que era aquele que tem que crer pra ver. Tem que ter fé. São Tomé, de início, nobre João Maria França, era alguém que tinha que ver pra crer. Então optemos por Santo Agostinho. Vamos ter fé, vamos se permitir. E se vale a pena, eu tenho convicção que vale, João Maria França.
Lembrei agora, nobre vereadora, de uma poesia que Flávio Santos não tá aqui, o poeta do grupo, mas eu peço licença a ele pra, de repente... Tem uma poesia que diz o seguinte, “Ó mar salgado, quanto do teu sal são lágrimas de Portugal. Por te cruzarmos, quantas mães choraram, quantos filhos em vão rezaram, quantas noivas ficaram por casar para que fosse nosso, ó mar. Valeu a pena? Tudo vale a pena se a alma não é pequena. Prá quem quer passar além do Bojador, tem que passar além da dor. Deus ao mar o perigo e o abismo deu, mas nele é que espelhou o céu”, Fernando Pessoa, mensagens, Mar português ou Mar de Portugal, como queiram. Isso retrata muito a questão do valer a pena. Pra uma compreensão melhor, sei que alguns de vocês conhecem essa poesia, que ela é muito famosa, o Bojador era o cabo do Bojador, o cabo do medo, no tempo das grandes navegações, que era uma área de difícil navegação, mas quando os navegantes ultrapassavam o cabo do Bojador se deparavam com o mar calmo, propício a boa navegação. Isso no tempo das grandes navegações, onde havia uma necessidade de expandir os seus limites marítimos, os seus limites territoriais.
Nós queremos ultrapassar o limite, mas não pra conquistar limites marítimos ou territoriais. Nós buscamos ampliar o horizonte do conhecimento de nossa cultura.
Professora Bel, como diz Cora Coralina, “Estamos todos nós matriculados na escola da vida, onde o mestre é o tempo”. Estamos todos nós aprendendo. Eu quero apenas sensibilizar vossas excelências da importância da aprovação desse projeto de lei. Da possibilidade de vossas excelências estarem gravando o nome de cada um de vocês na história da cultura do nosso município. Não tô sendo tolo em ser otimista. Eu não tô sendo tão otimista, eu tô sendo realista. Então, que vossas senhorias façam valer a pena a oportunidade que estão tendo, façam valer a pena, enquanto autoridades constituídas eleitas pelo voto democrático do povo. Será que vale a pena? Vale, não vale, nobre vereadora? Tem uma poesia também de Cora Coralina que diz o seguinte, “Não sei se a vida é curta ou longa demais pra nós, mas sei que nada do que vivemos faz sentido se não tocarmos no coração das pessoas. Muitas vezes basta ser o colo que acolhe, os braços que envolvem, a palavra que conforta, o silêncio que respeita, a alegria que contagia, a lágrima que rola, o desejo que sacia, o olhar que acaricia, o amor que promove. E isso não é coisa do outro mundo, é o que dá sentido à vida. É o que faz com que ela não seja nem curta nem longa demais, mas que seja intensa, verdadeira e pura enquanto durar.
Nobre vereador Diassis, seja o colo que acolhe esse projeto de lei, Fernandinha, seja o amor que promove. Façam valer a pena. É pra refletir mesmo.
Eu quero aqui encerrar minhas palavras, senhor presidente, agradecendo do fundo do coração em nome da população de Touros e em nome de nossa instituição, a forma, repito, democrática e republicana que foi encarado esse projeto de lei, que surgiu do povo que a instituição é apenas o instrumento mediador, onde o poder executivo municipal adotou esse projeto de lei, que foi adotado também por vossas excelências. Isso é uma prova que as instituições podem fazer parcerias e entrar em entendimento em prol do povo de Touros.
Agradeço o nobre presidente, Thiago; ao vereador Diassis; a vereadora, professora Bel; a nobre vereadora Nenê; Francisco, a forma prática, direta que falou e defendeu nosso projeto; Diego França, muitíssimo obrigado pela força, pela atenção; Fernandinha, muitíssimo obrigado; Pedro Barbosa Júnior, muitíssimo obrigado; Paulo Sérgio, muito obrigado; Felipe França, muitíssimo obrigado e Priscila, muitíssimo obrigado a todos vocês.
Fiz questão de citar o nome de cada um de vocês, inclusive agradecer até pela ausência mesmo de Joab, que se prontificou em aprovar esse projeto, mas que ele concorda com esse projeto, que é o mais importante.
Agradecer também aqui ao executivo municipal pela adoção desse projeto de lei. E em virtude de matéria tributária que vai impactar no orçamento, necessariamente teria que ser por iniciativa do executivo. Então, ao prefeito municipal, Assis, muitíssimo obrigado também.
Pra finalizar eu quero deixar aqui uma mensagem muito clara pra todos vocês e todos que nos acompanham. Nós iremos além do Bojador, nem que seja necessário a dor.
Muito obrigado pela atenção de todos!
Texto transcrito da página oficial da Câmara Municipal de Touros, pelo Jornalista Luiz Penha.